O assessor para assuntos internacionais da Presidência da República, Celso Amorim, afirmou, em audiência pública no Senado, nesta quinta-feira, que o Brasil não reconhecerá o governo de Nicolás Maduro, a partir de janeiro do ano que vem, se as atas eleitorais não aparecerem. Desde a eleição no país vizinho, o governo brasileiro espera a publicação dos boletins de urna, juntamente com a contagem de votos, que possam comprovar quem venceu as eleições: se Maduro ou o candidato da oposição, Edmundo González.
Se não houver algum acordo que possibilite avançar, não vamos reconhecer o governo se as atas não aparecerem — afirmou.
Amorim disse que o governo brasileiro não estabelecerá uma data para que o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) da Venezuela divulgue os documentos que mostrem como foi a votação..
— Não vamos dar um ultimato. Ultimato, quando se cumpre, é um desastre, e quando não se cumpre, perde-se a credibilidade — afirmou.
Ao longo da sessão, Amorim explicou aos parlamentares a posição do Brasil diante da crise, que começou após a eleição no país vizinho, em 28 de julho último. Reafimou a posição brasileira de aguardar as atas eleitorais e voltou a defender uma solução negociada para a Venezuela.
— Os principais dilemas são em torno da divulgação dos resultaados e da atuação do Tribunal de Justiça. A solução precisa vir do diálogo. É difícil, mas tem que ser tentada.
Perguntado sobre o que o governo fará, se as atas não aparecerem, ele respondeu:
—A impaciência não é boa conselheira. Vamos encontrar uma solução democratica, eleitoral e pacífica.
Lula sugere nova eleição
Nesta quinta-feira, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que ainda não reconhece a vitória de Nicolás Maduro e sugeriu a convocação de novas eleições.. Lula disse o líder venezuelano “sabe que está devendo” uma explicação ao mundo e que precisa ter bom sendo e convocar novas eleições.
— Ainda não (reconheço que ganhou a eleição). Ele sabe que está devendo uma explicação para o mundo. Ele sabe disso — afirmou Lula durante entrevista à Rádio T, em Curitiba.
Amorim leu o título da matéria publicada no site do GLOBO, com a declaração de Lula, aos senadores. Ressaltou que “já está muito clara a impaciência do presidente Lula em relação à demora das atas”.
Segundo turno
Celso Amorim esclareceu aos senadores da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional que não fez uma proposta dea ideia de uma nova eleição, ou segundo turno, na Venezuela, que ele sugeriu Lula, é embrionária e não foi discutida com a Colômbia — que, junto com o Brasil, tenta abrir um canal diálogo entre o presidente venezuelano Nicolás Maduro e o diplomata Edmundo González.
— O que é curioso de novas eleições é que tanto um quanto o outro teriam que aceitar.
María Corina
Amorim foi cobrado pelos senadores da oposição, por não ter se reunido com María Corina Machado. Ele explicou que preferiu falar com outros interlocutores, para evitar perder o canal com o governo Maduro..
— María Corina tem tido conversas com autoridades brasileiras de alto nível — afirmou.
Direitos humanos
Amorim afirmou que o Brasil condena a violência de direitos humanos na Venezuela, com a prisão de opositores no país pela polícia de Maduro. Disse acreditar que, em uma solução pacífica, os prisioneiros serão soltos e, caso contrário, o governo brasileiro intercederá junto a Caracas pela libertação.
—Todos serão soltos e se não forem, nós agiremos.
Em resposta às críticas de senadores da oposição, Amorim lembrou que o Brasil assumiu os cuidados da embaixada da Argentina, que abriga opositores da líder da oposição venezuelana, María Corina Machado. Revelou que o Brasil colocou um avião à disposição para que os asilados possam sair do país.
A eleição
O presidente Nicolas Maduro foi declarado eleito pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE) venezuelano. Porém, a oposição e parte da comunidade internacional afirmam que o vencedor foi González.
Sem tornar públicos, como diz a legislação, os dados de cada uma das mais de 30 mil mesas de votação, o CNE deu a vitória para o atual presidente Nicolás Maduro por 51,95% dos votos, contra 43,18% do 2º colocado, o opositor Edmundo González. A oposição apresentou supostas atas eleitorais que mostram seu candidato teve mais de 60% dos votos .
Partiu da senadora Tereza Cristina (PP-MS), da oposição, o requerimento de convite para Amorim e o chanceler Mauro Vieira, que também irá ao Senado nos próximos dias. O assessor do presidente Luiz Inácio Lula da Silva fará um relato sobre sua ida a Caracas, para acompanhar a eleição, e os contatos que teve no país caribenho.
Amorim esteve em Caracas no periodo de 26 a 30 de julho. Ele conversou com representantes de Maduro e da oposição.
— Ambos lados pareceram muito convictos da vitória, mas com desconfiança mútua— afirmou.
Depois da eleição, e iniciada a crise, segundo Amorim, Maduro disse a ele que ainda não havia apresentado os boletins de urna, devido a um ataque cibernético. O venezuelano disse que iria haver a divulgação dos documentos.
Amorim comentou que um dos obstáculos para a integração regional é a situação política na Venezuela. Ele disse que crises no país vizinho são frequentes nas últimas décadas e uma das causas é a divisão na sociedade venezuelana.
— Um dos maiores desafios da integração regional é o processo poltico venezuelano —afirmou.
A posição do governo brasileiro é de aguardar a divulgação das atas eleitorais , com a contagem de votos, antes de reconhecer Maduro ou González como aquele que tomará posse em janeiro do ano que vem.
Hoje, Brasil e Colômbia discutem uma estratégia comum para convencer as partes a abrirem um canal de diálogo. O assunto foi discutido na tarde de quarta-feira, em um telefonema entre Lula e o presidente da Colômbia, Gustavo Petro.
Além disso, nesta quinta-feira, o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, vai se reunir com o chanceler colombiano, Luis Gilberto Murillo, em Bogotá.
Antes parte do trio de países que buscavam uma solução para a crise, o México deixou o grupo. O presidente Andrés Manuel López Obrador afirmou que prefere esperar por uma decisão da Suprema Corte da Venezuela e já demonstrou desconforto, caso precise tomar decisões dois meses antes de deixar o cargo. Em outubro, López Obrador será substituído por Claudia Sheinbaum, que já indicou que não pretende se envolver no impasse.
O GLOBO
Foto: Fabio Rodriguez/Agência Brasil